segunda-feira, 23 de maio de 2011

Comentário ao Acórdão "Foto-Frost"


Acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Outubro de 1987 –“ Foto-Frost” contra Hauptzollant Luebeck-ost:

Este acórdão tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.º do Tratado CEE, pelo Finanzgericht Hamburg (República Federal da Alemanha) destinado a obter no processo pendente, neste órgão jurisdicional, uma decisão prejudicial sobre a interpretação do artigo 177.º do Tratado CEE.

Sumula da decisão do Tribunal de Justiça:

“ Os tribunais nacionais não são competentes para declarar a invalidade dos actos das Instituições Comunitárias”.

Alcance do Acórdão:

Foi a primeira vez que o Tribunal de Justiça se viu confrontado com a necessidade de responder à melindrosa questão de saber se os tribunais dos Estados-Membros, que não decidem em última instância, eram competentes para se pronunciarem acerca da invalidade de actos comunitários.

Importa saber que se trata de uma questão prejudicial relativa à validade de um acto de direito comunitário e não de impugnação de direito nacional, nem de procurar a interpretação de um acto jurídico comunitário controvertido.

Mais, o problema é colocado no âmbito de uma decisão nacional susceptível de recurso de direito interno e, portanto, o recurso à interpelação do Tribunal de Justiça não é um dever, mas uma faculdade do juiz “a quo”.

Tem de se ter, igualmente, em conta, que o processo das questões prejudiciais, na vertente da apreciação da validade, é um dos meios processuais que o direito comunitário proporciona para o controlo da legalidade dos actos comunitários.

Resolução dada à questão controvertida no caso concreto:

As partes intervenientes no processo solicitaram ao Tribunal de Justiça que este se pronunciasse negativamente ao problema colocado.

No mesmo sentido, foi o parecer do advogado-geral Mancini.

Contudo, o parecer de Mancini deixou transparecer algumas dúvidas de interpretação do artigo, na altura em vigor, 177.º do Tratado da CEE, uma vez que este parece afirmar que a competência dos tribunais nacionais é ilimitada.

No entanto, numa interpretação mais atenta do mesmo artigo, pode-se retirar que a validade e a interpretação dos actos não são atribuídas à jurisdição dos Tribunais Nacionais, ou seja, não houve intenção de atribuir competência para aferirem da validade ou invalidade de normas comunitárias.

Para melhor esclarecer esta sua interpretação, Mancini acrescenta que a atribuição de tal competência aos tribunais nacionais, isto é, a declaração de invalidade de normas aprovadas por Instituições Comunitárias, não garantiria um alcance generalizado e, consequentemente, não garantiria uma aplicação uniforme do Direito Comunitário na União Europeia.

Deste modo, estão garantidos os princípios da segurança e da coesão jurídicas da comunidade.

Se tal fosse possível, a declaração de invalidade, por um juiz nacional de um Estado-Membro, de uma norma comunitária, levaria à violação do princípio da coesão jurídica comunitária.

Não se julgue que tais normas ficam isentas de fiscalização quanto à sua validade, apenas se afirma que o Tribunal de Justiça é o tribunal mais competente para aferir de tal validade.

Na verdade, pode acontecer que num tribunal administrativo nacional seja invocada a invalidade de um acto de Direito Comunitário. O que o resulta deste acórdão é que o tribunal nacional não tem competência para declarar a nulidade ou anular esse acto. Mas, se o juiz nacional estiver convencido de que o acto é inválido, este é obrigado a suscitar perante o Tribunal de Justiça a questão prejudicial de apreciação da validade do acto de Direito Comunitário, independentemente de da sua decisão caber recurso jurisdicional de Direito Interno.

Este é o entendimento que, pacificamente, todos os Estados-membros têm seguido – a decisão do Tribunal trouxe um novo horizonte jurisprudencial.

Estamos perante uma relação de colaboração entre o Tribunal de Justiça e os tribunais nacionais.

Caso assim não acontecesse estar-se-ia a pôr em risco o efeito obrigatório destes mesmos actos, na medida em que qualquer juiz nacional poderia afastar um acto desta natureza.

Objectivamente, o que se pretende é uma aplicação uniforme do Direito
Comunitário, ou seja, que os actos adoptados pelas Instituições Comunitárias sejam aplicados de igual forma em todos os estados-membros.

Bibliografia:

· Quadros, Fausto, “A europeização do contencioso administrativo” In: Estudos em homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano : no centenário do seu nascimento. - Lisboa. - Vol. 1, 2006, p. 385-406;
· Miranda, Alberto Souto, “A Competência dos Tribunais dos Estados-Membros para Apreciarem a Validade dos Actos Comunitários no Âmbito do Art. 177.º do Tratado de Roma”, www.estig.ipbeja.pt, 1987;
· Quadros, Fausto, “Contencioso Comunitário”, Almedina, 2005.

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