quinta-feira, 28 de abril de 2011

O Princípio da Livre Cumulação de Pedidos

A cumulação de pedidos é um importante instrumento de simplificação do acesso à justiça podendo deste modo ser visto como um corolário do princípio da tutela jurisdicional efectiva. Efectivamente, a possibilidade de se proceder à cumulação de pedidos, eliminando a necessidade de se ter de lançar mão a sucessivos meios processuais, com diferentes pretensões mas englobadas todas na mesma relação jurídica material controvertida é uma efectivação plena da tutela jurisdicional efectiva.
Esta é permitida no artigo 4º do CPTA, nas disposições gerais, e pelo artigo 47º CPTA a propósito da acção administrativa especial.
A ideia de cumulação de pedidos não se manifesta apenas no momento inicial da propositura da acção, prolongando-se também ao longo da subsistência do processo, admitindo-se assim a ideia de cumulação sucessiva (não obstante implicar a modificação objectiva da instância).
Nos termos do artigo 5º CPTA, o facto de determinadas pretensões deverem ser deduzidas em processo comum e outras estarem sujeitas a forma de processo especial, não obsta a que haja um caso de cumulação.
Vejamos agora hipóteses de cumulação:
Os pedidos de condenação da Administração por danos resultantes de actos ilegais podem ser fundados na responsabilidade civil da Administração (decorre de acto ilegal como facto ilícito). Este pedido pode ser cumulado no processo de impugnação, que é dirigido à anulação ou à declaração de nulidade de actos ilegais. Tal resulta dos artigos 4º nº 2 al. f) e 47º nº 1 CPTA.
Há também a hipótese de, por antecipação, se cumularem no processo de impugnação de actos administrativos ilegais, pretensões dirigidas ao restabelecimento da situação que existiria se o acto não tivesse sido praticado (nos termos do artigo 4º nº 2 a) CPTA) e o cumprimento de deveres que a Administração não tenha cumprido com fundamento no acto impugnado (47º nº 2 a) CPTA). Tal é admitido pelo princípio da economia processual, pelo qual, através da pretensão anulatória sejam cumuladas outras pretensões cuja procedência dependa daquela e que possam ser, dessa forma, diferidas em conjunto.
Os particulares têm ainda a possibilidade, nos termos do artigo 47º nº3 CPTA, de cumular, no âmbito do processo de impugnação de actos administrativos ilegais, um pedido que imponha à Administração a prática dos actos e operações que, após a anulação, sejam devidos para reconstituir a situação que deveria existir se o acto não fosse anulável. Então, sempre que a anulação do acto não seja só por si suficiente para que seja restabelecida a situação do interessado, ela passa a poder ser acompanhada pela condenação à prática dos actos jurídicos e operações materiais que forem devidos e pelo cumprimento dos deveres que são impostos à Administração por efeito da anulação (podendo neste caso ser fixado um prazo para o cumprimento desses deveres e uma sanção pecuniária compulsória destinada a prevenir o cumprimento, tal como refere o artigo 44º CPTA).
A cumulação também é admitida nas situações de uma acção dirigida à condenação da Administração à prática de um acto administrativo ilegalmente recusado ou omitido (artigo 66º e seguintes CPTA), nomeadamente no que toca a um pedido de indemnização pelos danos resultantes da recusa ou omissão ilegal (artigo 4º nº2 f) CPTA), a um pedido de condenação da Administração à adopção dos actos jurídicos e à realização das operações materiais que não teria omitido se tivesse adoptado o acto devido quando pretendido (tal significa uma reconstituição hipotética, artigo 4º nº2 c) CPTA).
Se olharmos a um processo em que se impugne um acto administrativo e ainda se peça a reconstituição da situação actual hipotética, assim como a reparação dos danos causados, é ainda possível cumular o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral da eventual norma emanada no exercício da função administrativa, na qual aquele acto se tenha baseado, nos termos do artigo 73º CPTA. Para tal, será necessário que estejam preenchidos os pressupostos referidos no artigo.
Uma cumulação admissível e que merece relevância no Contencioso Administrativo é ainda aquele em que se verifica um pedido de condenação da Administração à pratica de um acto administrativo, com o pedido de anulação de um acto administrativo que tenha sido ilegalmente praticado, nos termos do artigo 4º nº2 c) e 47º nº2  a) CPTA. Tal cumulação não é necessária no caso de o acto ter sido expressamente recusado, de acordo com os artigos 51º nº4 e 66º nº 2 CPTA. Tal cumulação interessa quando o conteúdo pretendido do interessado se contraponha a um acto administrativo de conteúdo positivo que tenha introduzido uma modificação em favor de terceiro, em detrimento das pretensões do interessado, que pretendia ser o beneficiário. Pode então o interessado pedir a anulação do acto positivo, pretendo a sua substituição, e simultaneamente solicitar ao tribunal a condenação da Administração à prática do acto de substituição.
Em matéria contratual, é possível cumular-se no processo de impugnação de um acto administrativo praticado no âmbito de um procedimento pré-contratual, o pedido de anulação ou declaração de nulidade do contrato cuja validade dependa desse acto (artigo 4º nº2 d) e 47º nº2 c) CPTA).
Concluindo, a cumulação de pedidos, tal como refere o Professor Doutro Vasco Pereira da Silva, é uma forma que permite, do lado dos particulares, assegurar um acesso efectivo destes à justiça administrativa e, do lado do tribunal, vai implicar uma maior capacidade de adaptação do juiz para adequação do processo às necessidades práticas. Além disso, por poder tornar o processo moroso, pela sua complexidade, esta é apenas uma faculdade que o CPTA confere, que deve ser usada pelo autor, em função das sua pretensões e expectativas nelas depositadas.

Sem comentários:

Enviar um comentário